Segundo contam as historiadoras Tania Regina de Luca e Ana Luiza Martins, no livro História da Imprensa no Brasil (Contexto, 2008), 1808 não marcou apenas a chegada da Família Real portuguesa ao país, fugida de Napoleão. O primeiro periódico brasileiro nasceu naquele mesmo ano – o Correio Braziliense –, idealizado pelo jornalista e diplomata Hipólito da Costa (1774-1823). Depois do Correio, outras publicações vieram. Somente em São Paulo foram registrados cerca de 1.500 títulos no fim do século 19, de acordo com as historiadoras.
“Os primeiros periódicos iriam assistir à transformação da Colônia em Império e participar intensamente do processo”, escrevem as autoras do livro. “A imprensa é, a um só tempo, objeto e sujeito da história brasileira.” Tendo, então, uma relação tão íntima, não é de se estranhar que o conteúdo dos jornais servisse – como ocorre até hoje – como registros do dia a dia da sociedade. E não somente as notícias ou os editoriais cumpriram essa função.
Os classificados de emprego também revelam, curiosamente, momentos da história do trabalho e do emprego no Brasil. Foi o que pôde observar o jornalista e pesquisador Marcos Nogueira de Sá, autor de um capítulo sobre a trajetória desses anúncios, no volume 2 do Manual de gestão de pessoas e equipes (Gente, 2002). Conforme
apurou, os primeiros classificados publicados serviam para comunicar a fuga de escravos, ainda na década de 1870. “Eu tenho a primeira página do primeiro número do Estadão [O Estado de S. Paulo, jornal fundado em janeiro de 1875] – que se chamava Província de São Paulo –, que tem um desses anúncios. Não dá para dizer que era de empregos, mas ele dizia assim: ‘Procura-se escravo fugidio’.”
Para Nogueira, esses podem ser considerados os primeiros classificados do país ligados ao mundo corporativo. Uma espécie de “recado”, que somente em um segundo momento seria publicado com um critério, ou classificação – daí seu nome. “Eles não obedeciam a uma ordem”, retoma o jornalista. “Ficavam espalhados pelo jornal.”
Com a Lei Áurea – o fim da escravidão –,, sancionada em 13 de maio de 1888, os fazendeiros de café intensificaram a publicação das notas, mas com o objetivo de contratar ex-escravos experientes para lidar nos cafezais. Foi nesse momento, revela Nogueira, que os classificados se tornaram semelhantes com o que conhecemos hoje, ou seja, parecidos com os avisos de vagas de emprego. “Quando esses ‘recados’ começaram a ganhar corpo, a aumentar de número, eles passaram a ser classificados dentro do jornal, isto é, eram publicados por ordem alfabética, por tipo de emprego etc.” explica o pesquisador. “No Estadão, por exemplo, até meados da década de 1980, a classificação era pelo tipo da ocupação.”
A edição do Sarney
Os classificados de emprego tiveram seus 15 minutos de fama em 1989, quando o então presidente da República, José Sarney, citou o caderno de empregos do jornal O Estado de S. Paulo numa entrevista para despistar um repórter que o encurralara com uma pergunta sobre a recessão da época. Sarney respondeu: “Recessão? Pegue o Estadão de domingo e veja as 80 e tantas páginas de oferta de empregos. Que recessão é essa?”, lembra o jornalista. Depois da declaração, a imprensa foi em massa conferir a edição citada pelo presidente. De fato, havia quase 100 páginas destinadas a ofertas de emprego. Até hoje Nogueira ainda não conseguiu responder à pergunta que ficou: Sarney estaria certo ou, naquele momento, a realidade dos classificados e a economia do país estiveram em descompasso?
Dois públicos, muitos anúncios
Talvez a resposta tenha vindo décadas depois. Atualmente, com o falta de mão de obra qualificada, empresas tentam encontrar candidatos aptos a preencher milhares de vagas em aberto. A isso, os classificados respondem, dividindo-se em diferentes veículos para chegar até seu público. Nogueira detalha que existem basicamente dois perfis nessa demanda: o indivíduo que está sem trabalho algum e o profissional que está empregado, mas que pode ser fisgado por uma oportunidade de melhor colocação. Com a internet, o pesquisador acredita que esses dois públicos estão se afastando ainda mais. “O desempregado dá tiro para todos os lados na hora de procurar emprego”, analisa Nogueira. “Ele passa o dia na frente do computador mandando currículo para centenas de sites”. Para atrair o segundo perfil, é exigido dos anunciantes um pouco mais de elaboração. “profissional Aquele que está empregado tem outro tipo de atitude”, segue o jornalista. “Ele não está procurando nada, o que o coloca numa situação mais confortável. Ele é mais seletivo.” Nesse caso, os meios impressos têm ainda um desafio extra: por não poderem competir com a especificidade oferecida pela web, o que vale mesmo é o tamanho. Quanto maior, mais eficaz. “É para o médico que está no mercado, mas pode ver uma oportunidade melhor para trabalhar em Sorocaba”, exemplifica Nogueira. “Esses anúncios são grandes, pois querem pegar os profissionais qualificados e que estão colocados. A intenção deles é impactar.”
Em outro mundo
Para o jornalista, como o próprio mercado de trabalho no Brasil evoluiu muito rapidamente – e, aliado a isso, os anúncios de emprego encontraram o veículo ideal nos sites especializados na internet –, a própria dinâmica da oferta e da procura de vagas passou a ser tratada “profissionalmente”, define.
Nos níveis que exigem profissionais mais qualificados, como é o caso dos executivos, por exemplo, a internet e as consultorias, segundo Nogueira, é que atendem à demanda. Para os nichos que exigem pouca qualificação, os jornais ainda têm forte influência, principalmente as publicações populares e nas cidades menores. “Quando você sai de São Paulo é outro mudo”, compara o pesquisador.
Fonte: http://www.canalrh.com.br/revista/revista_artigo.asp?o={8735DFDC-BEF1-4A02-9F33-2AB694F5C464}
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