sábado, 18 de maio de 2019


"Havia uma ideia... Uma ideia de reunir um grupo de pessoas extraordinárias, para ver se eles poderiam se tornar algo mais. Ver se eles poderiam trabalhar juntos quando nós precisássemos que eles lutassem as batalhas que nós nunca poderíamos." Foi apoiada nesta frase que uma das maiores empreitadas do entretenimento de todos os tempos foi estruturada. Quando Homem de Ferro (Iron Man), foi lançado em 2008, e quando pouco depois no mesmo ano, Tony Stark apareceu numa cena pós-créditos de O Incrível Hulk para falar de uma certa iniciativa, pouca gente acreditaria que onze anos depois, os efeitos do lançamento de Homem de Ferro e daquela cena no filme seguinte continuariam se refletindo com tanta ressonância. Homem de Ferro marcou o início do MCU, o Universo Cinematográfico Marvel (Marvel Cinematic Universe).
O curioso é que até o início dos anos 2000, a Marvel Comics, gigante dos quadrinhos criada pelo eterno Stan Lee, infelizmente falecido em novembro do ano passado, apenas engatinhava no cinema, tendo no portfólio somente algumas produções obscuras dos heróis Capitão América, Thor, Hulk e Justiceiro lançadas nos anos 80 e 90.
Ao contrário de sua rival DC Comics, cujos heróis de frente Batman e Superman já haviam sido adaptados com muito sucesso para as telonas. Mas foi logo no começo da década passada que as coisas começaram a mudar para o selo Marvel nos cinemas.
Aproveitando o sucesso do modesto porém sólido X-Men, produção da Fox dirigida por Bryan Singer no ano 2000, a Sony Pictures lançou o fenômeno Homem-Aranha em 2002, aventura dirigida pelo genial Sam Raimi que arrebentou com as bilheterias mundiais e abriu o caminho para que os filmes de super-heróis de estabelecessem como a nova powerhouse cinematográfica do momento. De 2000 a 2007, Homem-Aranha e X-Men se tornaram franquias, o Quarteto Fantástico também ganhou suas adaptações para o cinema, assim como outros heróis, Marvel ou não, aproveitaram a onda e ganharam versões cinematográficas também, como Hellboy, Blade (apesar do filme original ser de 98), o Justiceiro, entre outros. Resumindo, a Marvel já começava a se tornar uma gigante das telas, mas seus direitos de produção e distribuição se dividiam entre a Fox (X-Men, Quarteto Fantástico) e a Sony (Homem-Aranha e Justiceiro).
Chega o ano de 2007. Avi Arad, presidente da Marvel Entertainment, toma a decisão que viria a transformar o destino da Marvel para sempre, não só nos cinemas, mas como potência do entretenimento pop: Arad nomeia o produtor americano Kevin Feige como o presidente do novo Marvel Studios. Arad não poderia estar mais correto em sua decisão: Centralizado na figura de Feige, entre 2008 e 2019, os 22 filmes do MCU combinados já renderam uma bilheteria bruta que supera os absurdos $20 bilhões de dólares e segue arrecadando. Neste exato momento, enquanto escrevo este artigo, Vingadores: Ultimato (Avengers: Endgame, EUA, 2019), caminha à passos largos para se tornar a maior bilheteria mundial de todos os tempos, superando os campeões Titanic (1997), o mais recente Star Wars: O Despertar da Força (2015) e o próprio Vingadores: Guerra Infinita, lançado em abril do ano passado.
A bilheteria de Vingadores: Ultimato ultrapassou a marca dos 2 bilhões de dólares em apenas doze dias, e a estimativa é que quando você estiver lendo este texto, o filme já tenha tirado Avatar do posto de maior bilheteria da história. Ou tenha pelo menos chegado muito perto.
Tamanho case de sucesso pode levar o público a imaginar que a estratégia de Feige seja algo de outro mundo, e ainda que de fato o plano do cara seja muito bem elaborado, tudo gira em torno de uma ideia simples, a qual Feige pescou da própria estrutura dos quadrinhos: histórias individuais, mas pertencentes à um arco narrativo maior e onipresente. Ficou claro? Não? Então vou desenhar para vocês: imaginem cada filme do MCU como uma revista em quadrinhos, sendo que cada uma destas "revistas", obedecem à uma história maior que envolve todas elas. Neste caso, esta saga foi chamada de Infinity Saga, ou "Saga do Infinito", nome que remete às Jóias do Infinito, relíquias cósmicas que garantem poder praticamente ilimitado a quem as possuir. Como se a ideia já não fosse muito bem pensada, dentro desta saga Feige ainda quebrou a narrativa do arco em três fases, de forma que fosse possível obter não só um, mas três grandes ápices em uma mesma história.
A Fase Um começou com Homem de Ferro, foi agregando outros filmes e seus respectivos heróis, como Capitão América, Thor e Hulk, e culminou no mega-hit Os Vingadores (The Avengers), em 2012. A Fase Dois teve início com Homem de Ferro 3 no ano seguinte, além de outras continuações e a entrada em cena dos Guardiões da Galáxia em 2014, para em seguida terminar em Vingadores: Era de Ultron (Avengers: Age of Ultron), em 2015. E a esperada Fase Três teve início com Capitão América: Guerra Civil (2016), agregou heróis como Doutor Estranho, Homem-Formiga, Pantera Negra e Capitã Marvel, até chegar à este excelente Vingadores: Ultimato, o ápice dos ápices do MCU até agora, e sequência direta do também ótimo Vingadores: Guerra Infinita. E de fato, Vingadores: Ultimato é tudo o que os fãs esperavam de um filme de tamanho porte. Uma épica conclusão que não só respeita a mitologia apresentada no MCU até agora, como mostra um carinho recíproco com seu público, que há mais de dez anos segue de maneira fiel cada uma das aventuras do universo Marvel no cinema.
Ultimato tem início 23 dias depois dos catastróficos eventos finais de Guerra Infinita, onde o super-vilão Thanos (Josh Brolin), em posse das Jóias do Infinito (as Infinity Stones), conseguiu concretizar seus planos de exterminar metade de todas as formas de vida do universo. Sentindo o peso da responsabilidade nas costas, os heróis que ficaram decidem colocar em prática um mirabolante plano para desfazer a obra maligna de Thanos e trazer todos de volta. Mas para isso, eles terão que superar não só as barreiras do tempo e do espaço, mas também seus próprios medos e frustrações.
Com praticamente três horas de duração, Vingadores: Ultimato é um épico de super-heróis como você nunca viu. Claro, o filme se origina diretamente do seu predecessor Guerra Infinita, mas é impressionante como Ultimato é bem sucedido até como um filme solo. Pode-se dizer que Ultimato não é nem uma típica sequência, pois pela primeira vez realmente, o impacto de um filme do MCU está em sua narrativa. Vingadores: Ultimato não é apenas o que queremos de um blockbuster; mas sim o blockbuster que apenas o Universo Cinematográfico Marvel poderia entregar.
Ao final de Guerra Infinita, é impossível não guardar o sentimento de que o filme era apenas metade da história. O antagonista Thanos é basicamente o protagonista, já que é ele quem conduz a ação na narrativa, e ainda que seja divertido misturar e combinar super-heróis, é a conclusão de Guerra Infinita que torna o filme algo novo dentro do MCU, ainda que um tanto frustrante em termos de entretenimento (o vilão vence). De tal forma que Ultimato acaba por ser a recompensa que o fã da Marvel merecia e esperava. Mesmo que o grande público já tivesse uma boa ideia do escopo maior do filme mesmo antes de entrar no cinema, os diretores Joe e Anthony Russo mostraram-se verdadeiros mestres da narrativa propulsiva. Mesmo com suas três horas de duração, o filme nunca parece longo.
A vertente de dividir os personagens e separá-los, desta vez em diferentes equipes encarregadas de recuperar as Jóias do Infinito em diferentes épocas, oferece não só uma dinâmica divertida, como também uma história que nunca fica estagnada. Cada cena transmite uma sensação de conquista, e os irmãos Russo carregam a narrativa com foco total nos personagens. Por isso o filme funciona tão bem. Ultimato não começa com aviões caindo do céu ou com massivas explosões, mas sim com o Gavião Arqueiro (Jeremy Renner, ótimo) perdendo sua família. O peso desta perda permeia todo o filme, de forma que o público nunca esqueça pelo que os heróis estão realmente lutando.
Vingadores: Ultimato sabe explorar o peso das consequências. A produção nunca resume-se a uma busca pela resolução perfeita para cada um de seus super-heróis, tampouco consiste em uma celebração do status quo. Acontecem coisas neste filme que transformarão para sempre o MCU, e tais acontecimentos dão tanto à Guerra Infinita quanto à Ultimato um peso e uma urgência que vão além de trazer personagens de volta à vida. A narrativa é tão bem construída que eu me preocupei com o resultado da missão mesmo já sabendo que Thanos não venceria. Claro que há alguns furos no roteiro, principalmente pelo fato de que se trata de um filme que aborda o tema da viagem no tempo. Contudo, é preciso lembrar que estamos falando de um filme ambientado em um universo onde tudo é possível, e ainda assim, Ultimato nunca coloca uma possível lógica temporal acima de seus personagens ou sua história. Este é o maior acerto do filme.
Além do mais, sem a variante da viagem no tempo não seria possível experimentar mais uma vez o inacreditável alcance do MCU, construído nestes últimos dez anos. Quando os personagens revisitam os filmes anteriores da saga é que a magia do MCU ganha vida em suas cores mais incríveis. As interações e as presenças dos personagens em suas versões antigas e atuais são absolutamente encantadoras, um lembrete perfeito da longa jornada em que todos estamos, e que ainda consegue dar um novo olhar a alguns dos filmes anteriores.
Mas no final das contas, tudo gira mesmo em torno dos personagens, e praticamente todos eles tem sua chance de brilhar. Há uma sequência cujo foco são as jornadas de Tony Stark (Robert Downey Jr.) e Steve Rogers (Chris Evans), e ainda que a mesma soe um tanto aleatória, o público simplesmente não se importa, pois mais uma vez, o foco é nos personagens. O que perderam, o que têm a ganhar, e para onde estão indo. É o tipo de cena que só funciona se você já assistiu a muitos filmes destes personagens, e uma vez que você se importa com o Homem de Ferro e com o Capitão América, automaticamente você se importa com o destino de suas viagens.
Felizmente, Vingadores: Ultimato nunca soa como um "desfile da vitória", mas sim uma cativante história com seus próprios riscos e perigos. Esta é a culminação que o MCU almejava, e na massiva maior parte do tempo, eles acertam na mosca. O filme pode até não ser realmente sobre nada em particular, mas seu escopo narrativo como um todo (por mais amplo que seja), ressoa forte no coração do espectador, graças às escolhas que seus personagens fazem. Em nenhum momento durante as três horas do filme eu me senti enganado por emoções artificiais ou fan service. Eu me senti como quem experimenta o capítulo final de uma longa história antes de uma nova história começar.
E de fato, qual seria esta nova história? Vale lembrar que agora a Fox e também as séries de TV com o selo Marvel que antes pertenciam à Netflix também estão sob a batuta da toda-poderosa Disney, detentora da Marvel Studios. Isso permite que heróis como os X-Men, O Quarteto Fantástico, o Justiceiro, Demolidor e agora especialmente o aloprado Deadpool e uma nova versão do furioso Wolverine, estão disponíveis para se juntar à brincadeira de Kevin Feige, que com certeza continuará aguçando a curiosidade do público ao entrelaçar as aventuras de seus heróis através de suas cenas pós-créditos, etc. Em novembro, a Disney lança seu próprio serviço de streaming, o Disney+, e novas séries do adorado vilão Loki e dos heróis Viúva Negra, Visão e Feiticeira Escarlate já estão em ponto de bala. Sem falar em Homem-Aranha: Longe de Casa, Doutor Estranho 2 e Guardiões da Galáxia 3, entre outras produções que em breve chegarão às telonas dando prosseguimento à uma nova saga do MCU. Só sei que depois de tantas produções notáveis dentro do Universo Cinematográfico Marvel, e com tantas opções e possibilidades para o futuro da empreitada, uma coisa é certa: Nunca foi tão fácil voltar a ser criança.
Vingadores: Ultimato está em cartaz nos cinemas brasileiros.

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