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quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Cuidado com a indústria do coaching

industria-do-coachingQuando eu era criança morei por dois anos em uma cidade de sete mil habitantes no interior de Minas Gerais. Lá, se você balançasse uma árvore entre agosto e dezembro caíam mangas. Hoje, no Brasil inteiro e em qualquer estação do ano, se você balançar uma árvore caem coaches – cuidado com sua cabeça pois alguns estão bem acima do peso.
Em sua busca por clientes – chamados coachees -grande parte destes novos coaches te abordará usando termos como “empoderamento” e falando que você tem um “potencial infinito”.  Mostrarão também os certificados de onde se formaram como coaches – como se isso garantisse alguma coisa – e falarão dos benefícios inimagináveis que você terá se trabalhar com eles. Desconfie.
Infelizmente a formação em coaching se tornou uma indústria altamente lucrativa no país, a ponto de os requisitos para se tornar um coach serem basicamente: saber ler, poder pagar e frequentar o curso.

Para quem pensa em contratar um coach

Coaching é sim, uma abordagem de intervenção que leva as pessoas a desenvolverem, de modo pragmático e objetivo, os comportamentos mais adequados para conseguir os resultados que desejam na vida. Trata-se de uma das mais poderosas ferramentas de desenvolvimento humano existentes, e costuma valer casa centavo investido. Mas não é para qualquer um.
Se você pensa em contratar um coach, muito cuidado na hora de escolher o profissional. Peça referências e pesquise na web para ver se encontra algum histórico de atuação com desenvolvimento de pessoas ou pelo menos quaisquer evidências (artigos, site, participação em associações) que permitam confirmar que não se trata de um aventureiro. Formação é importante, mas não é evidência de competência. Resultados anteriores são.
Se o profissional tiver um site, entre, navegue e busque por depoimentos de ex clientes e pessoas que conhecem o trabalho. Analisar a história pregressa também é interessante. De repente o sujeito tinha um açougue até dois meses atrás, vendeu o negócio, fez um curso de coaching e agora está ai na praça distribuindo cartões.

A água é molhada e o fogo é quente

Uma prática bastante comum no universo do coaching, e que em minha opinião só serve para tirar o crédito desta abordagem, é a utilização massiva de mensagens contendo platitudes emocionais e comportamentais com a justificativa de que motivam as pessoas.
Frases como “você pode chegar ao topo se acreditar” ou “nunca é tarde para sonhar” e coisas do gênero, são de uma simploriedade intelectual absurda. Reconheço que alguns axiomas de certos pensadores tem muito a nos acrescentar, mas grande parte do que se posta por aí é apenas redundância vazia.
Ao falar com um coach, procure por uma linguagem pragmática, objetiva, sem excesso de citações ou frases de efeito. Se a pessoa ficar repetindo o tipo de coisa que você lê em livretos de auto ajuda de banca de revistas, compre os livretos, você vai economizar uma grana preta.
Coaching é uma abordagem de desenvolvimento humano extremamente assertiva e funcional, e acho um desfavor à profissão o fato de que seja propagandeado com discursos pseudo-motivacionais ou através de frases de efeito (sem efeito) colocadas em cima de fotografias bonitas no Facebook.

Para você que é coach, uma reflexão

Agora vão me chamar de corporativista e me atirar pedras. Que venham. Defendo abertamente que haja algum tipo de regulamentação mais séria ou ao menos a instituição de um processo que avalie melhor o indivíduo que quer se tornar um coach.
Como todo respeito às duas profissões que vou citar, mas se você for um cabeleireiro ruim ou um professor de inglês medíocre, o próprio mercado vai se encarregar de te eliminar, e suas vítimas, ops, clientes, não sofrerão maiores danos, embora possam ficar claramente prejudicados.
Mas no caso do coaching estamos mexendo com a estrutura interna das pessoas. É um processo extremamente íntimo e que necessariamente tem fortíssimos impactos psicológicos. Tem gente que muda o rumo da vida de uma hora pra outra depois de um processo destes.
Eu sou psicólogo – como se isso fosse algum mérito – mas não defendo que profissionais de coaching tenham que ser psicólogos. Seria um absurdo, pois o processo nada tem a ver com terapia, apesar de haver muita psicologia envolvida.
No entanto, acho que a formação, pelo menos para pessoas que nunca tiveram nenhum contato com alguma ciência ligada ao desenvolvimento humano, deveria ser mais sólida, mais longa e mais seletiva. Não seletiva do ponto de vista financeiro (como é hoje), mas do ponto de vista educacional e comportamental.
Eu sei que estou criticando muito. Reconheço também que não tenho respostas claras sobre o que fazer para melhorar a qualidade da formação de coaches no mercado e proteger a imagem da profissão. Mas precisamos fazer algo.
A coisa ficou tão mercadológica que hoje já existem mais coaches ensinando outros coaches a conquistar clientes do que profissionais efetivamente atuando com o cliente final. Está se formando uma outra indústria em cima da que já existe.
Se você discorda de mim gostaria de ouvir seu ponto de vista. E se concorda peço sua ajuda e pergunto: o que podemos e devemos fazer para que uma abordagem tão séria e poderosa não acabe ficando mais banalizada do que mexerica na feira.
Alguma ideia? Não vale dizer alguma frase de efeito com fundo emocional.

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