Preocupado em tranquilizar o colega de trabalho apavorado durante uma viagem de avião a Vitória da Conquista, na Bahia, o coordenador regional de serviços de uma multinacional farmacêutica Bruno Larangeira tentava em vão conversar com ele. Rígido na poltrona por conta do estresse provocado por uma turbulência mais forte, comum naquela região, ele não respondia a nada. “Outras pessoas até gritavam, mas ele estava completamente calado e pálido”, conta Larangeira, habituado a viajar de avião pelo menos uma vez por semana. Na hora em que ouviu o amigo quebrar o silêncio e balbuciar lívido alguma coisa como “É, a coisa tá feia”, ele também passou a considerar a gravidade da situação. Voltou-se para ele novamente, e disse: “Rapaz, nós vamos morrer, mas vamos manter a dignidade”.
A turbulência passou, ninguém morreu e Larangeira está vivo para contar essa e outras histórias que presencia frequentemente. Em cada voo, ele diz ver sempre alguém, no mínimo, tenso. “A gente percebe o estresse e o sofrimento que passam essas pessoas”, conta Larangeira, que se tivesse medo de viajar de avião não poderia fazer o que faz. “Não é raro o dia em que vou num bate-volta para São Paulo, Rio de Janeiro ou alguma região do Nordeste”, diz ele, que, quando entrevista alguém para contratação checa se isso será um problema para o candidato.
Para os que pensam que é exagero, a psicóloga Elvira Gross, criadora do programa Medo de Voar e autora do livro “Avião. Viaje sem medo”, conta que atendeu um paciente que esmurrou um comissário de bordo para tentar abrir a porta do avião em pleno voo; outro que passa mal só de ver um avião no céu; e vários que chegam ao aeroporto e retornam sem coragem de fazer o check-in. “Tudo provocado pelos mais diversos tipos de medo”, afirma, acrescentando que mais de 50% das pessoas têm medo de voar. Ela explica que o desespero nem sempre é provocado somente pelo medo do avião, mas também pela fobia de locais fechados, outros por conta do pavor de altura ou, no caso dos que tiveram síndrome do pânico, pelo medo de passar pela mesma situação dentro de um avião.
“O curioso é que são pessoas que já viajaram várias vezes, mas que, por alguma circunstância, desenvolveram a fobia”, diz ela, que tem entre seus pacientes diretores de empresas, profissionais da área médica, advogados, entre outros. “Atendi executivo que preferiu deixar de fechar um negócio de milhões por não conseguir pegar um avião para a China”, conta ela, comentando que a fobia surge principalmente de um misto do que a pessoa está passando na vida e da falta de informação.
Por conta disso, a terapia é desenvolvida em parceria com a companhia aérea GOL, que permite o uso de simuladores, explicações técnicas e outras ações para deixar o paciente mais tranquilo sobre as questões de segurança e de como é o passo a passo de um voo. “É muito gratificante receber mensagens de antigos pacientes contando que estão de férias em Paris ou que conseguiram pegar um avião para conhecer o neto recém-nascido que mora em outro país”, conta Elvira, salientando que o tratamento consegue resolver cerca de 96% dos casos. O tempo da terapia varia de uma imersão de um dia, um ou dois meses, com sessões uma ou duas vezes na semana respectivamente.
Quem vê hoje a advogada Adriana Mello entrar e sair de um avião tranquilamente não imagina o quanto ela já sofreu por isso. Só o fato de pensar em voar já transformava a viagem dela em uma tortura. Além do desespero, das dores físicas e do sofrimento psicológico, Adriana chegou a ter atitudes que dão a ideia do quão constrangedor a situação pode ser. “De tão nervosa, já pedi para um desconhecido ir conversando comigo durante todo o voo”, conta a advogada, que já trocou o avião pela estrada em uma viagem de negócios, fato que não agradou a empresa por encarecer e prolongar o trajeto.
Comemorando seu comportamento tranquilo nos últimos voos, Adriana conta que o medo e os episódios constrangedores ficaram para trás após passar por tratamento psicológico. “Posso até ficar um pouco ansiosa, mas hoje consigo manter o controle da situação.”
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